10.06.2009

Outros significativos

Como se cria uma comunidade vibrante, que fervilhe nas nossas mãos? Como poderemos fazer aflorar o brilho nos nossos olhos quando pensamos em Ovar? Como poderemos criar uma memória colectiva que nos dê prazer, que nos faça pensar o quão bom é viver nesta comunidade?

O nosso micro cosmos dirá, provavelmente, que o primeiro parágrafo deste texto é estranho e assustador, assim como será quase inconveniente tentar responder a estas perguntas. Não estamos habituados a este tipo de raciocínios. Pela raíz.

Não estamos familiarizados com o futuro. O nosso futuro tem sido sempre um degrau do passado e não um futuro que se faz hoje, através da acção de todos.

Somos feitos de alcatrão e de betão e os nossos pensamentos parecem ser estradas mal pavimentadas e edifícios de gosto duvidoso. Temos sido os Outros. Lá longe, uns Outros que parecem estar desenhados num quadro esborratado e esburacado, inertes e imagináveis, apenas desligados do olhar que o observa.

Somos feitos de favores, olhares cúmplices, palavras não ditas que roçam significados insustentáveis. Somos rudes quando deveríamos ser compreensivos e simpáticos. Somos vários egos ao serviço de uma teia pegajosa.

Somos feitos de conflitos, sussurrados ao vento, sedentos de intrigas e maledicências. Arrepia-nos a independência e o pensamento que vai para além do horizonte. O que não controlamos amedronta-nos, pois o poder parece-nos fugir, escorregadio, por entre os dedos. E quem somos nós, imposições de poder, berros, insultos, negócios de penumbra e olhares de rapina?

O show off é o nosso lema. Mostramos, impiedosamente, a nossa previsível e insuportável forma de pintar o chão de preto e as paredes de desenhos - sublime!

Os Outros são de papel, assim como de papel é o boletim de voto. Frio, distante. Desligado do olhar do receptor do voto. Mármore que nos gela pela incerteza.

Temos sido estátuas plantadas por todo o concelho, insultados mesmo quando não nos falam. Não precisamos. Somos bons a criar histórias, a puxar o pano e a mexer as marionetas.

A nossa memória é tida como degenerativa. Esquecemo-nos facilmente, dirão alguns. Somos moles, talvez devido às mãos de barro que nos quebram.

As respostas iniciais serão mil perguntas e mil terrores que calcamos para esquecer. Varremo-las para baixo dos tapetes pretos.

A visão não é negra, apenas da cor da pedra.

Pegaremos nas cores, pintaremos respostas, e andaremos pela cidade todos pintados, com a esperança nas mãos.

Somos os Outros Significativos.

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